domingo, 6 de maio de 2012

Quero não


Eu costumo falar do quanto é importante ter disposição para conseguir conciliar as tarefas do dia a dia com as atividades que temos vontade de fazer. Realmente, sem esforço fica difícil realizar mais do que supõe a função descrita no crachá da empresa. Só que as pessoas têm defeitos e fraquezas, todo mundo tem dias e fases chatas de desestímulo – desconheço alguém que esteja livre da situação, por mais inspirado que seja.

Às vezes a sensação acorda com você, ou então fica esperando com um sorriso sarcástico ao lado do inconveniente despertador. A gente começa o dia torto, cai na trela do mau humor, e ai de quem passar na frente. Nesse dia, quaisquer banalidades tornam-se desafios inoportunos, porque a criatura aqui não está nem um pouco afim de vencê-los. É um dia sem vontade. Entenda, mundo.

Perceba que hoje eu não vou ficar ouvindo os problemas de ninguém. Vou desligar o celular, me enterrar no sofá e assistir aos filmes que deixei de ver no cinema. Vou ficar sem fazer nada, a louça vai ficar suja ali em cima da pia. É uma gripe voluntária, avise o patrão.

Hoje não vou comer só salada. Quero um prato de massa, um pote de sorvete, uma barra de chocolate. E não vou para a academia depois. Farei um estoque calórico.

Se me der vontade, vou virar a noite olhando fotos, escutando os discos que estavam empoeirados na prateleira, experimentando todas as roupas do armário. Ou chorando loucamente. Vou jogar videogame, passar trote, desenhar bigode em alguém que esteja dormindo. E se rolar uma chuva, pode me procurar na rua pulando em poças. Ou dormindo feito um filhote de urso. Vai saber.

Não quero saber o que deveria estar fazendo. Não me entendam errado; jamais sairia por aí chutando cachorrinhos ou dando informação errada para fazer alguém se perder. Simplesmente, sem o ímpeto de ser responsável, coerente ou agradável, mesmo que só por hoje, não o serei. Inclusive, eu poderia estar escrevendo algo melhor agora. Lamento, quero não.

Cada um tem seu motivo para entrar nessa vibração destoada, ou até razão nenhuma em específico. Não é necessário dar mil explicações para o vizinho que ouve você choramingando All by Myself a todo volume, mas, apesar de às vezes cansativo, cai bem avisar os amigos e a família – vai que o povo resolve fazer uma intervenção achando que a coisa toda tem a ver com drogas, sei lá. Melhor mesmo é não ofender ninguém com o próprio desânimo.

A explicação mais importante a gente dá para si. A companhia da qual não se pode desvencilhar é um porteiro que efetivamente necessita de satisfações; não dá para evitar confidenciar com ele o que está acontecendo aí dentro. Todo mundo precisa de um dia para si, sendo inútil ou se divertindo, mas vá lá. Não vai se deixar levar. Melhor tentar descobrir o que está fora do lugar para poder voltar ao normal. Porque sorvete é indiscutivelmente divino, mas ver poesia no trivial também não é nada mau.





Imagem: Gettyimages

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