quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O teste da meia


Recentemente me disseram que o teste da meia é infalível. É muito simples: se você leva mais do que dez minutos para colocar uma meia antes de ir a algum lugar, é porque não quer ir. Isso vale para o trabalho, um encontro, uma reunião, tanto faz. É claro que existe uma linha tênue entre não querer por não ter vontade e aquele nervosismo que causa ansiedade e um pouco de receio, mas que não significa necessariamente que você não quer fazer algo.

Realmente acredito que fazemos coisas demais contra a nossa vontade espontânea, em favor do que acreditamos – ou nos fazem acreditar – que é o correto. Quanto mais penso no assunto, mais duvido que exista realmente “a coisa certa a fazer”. Afinal, alguém aqui veio com manual de instruções ou encontrou por aí o guia das atitudes corretas?

À longa distância, consigo enxergar uma realidade em que as pessoas não dão extrema importância ao que os outros fazem, não acham que devem opinar sobre a vida alheia e não julgam prontamente o que lhes aparece pela frente. Certamente, não é assim que funciona na prática – apesar de ter potencial de solução para problemas de relacionamentos.

Somos julgados e fazemos julgamentos o tempo todo. É assim que a sociedade funciona, já é praticamente natural. A aparência, a cor, a classe social, a religião, a falta de religião, a opção sexual e até mesmo o modo como encaramos certas situações servem de embasamento para que nossas mentes construam um perfil do outro.

Todo esse monitoramento faz com que nos esforcemos para adaptarmo-nos aos padrões do que diferentes setores da sociedade julgam corretos. Mal começamos nossa jornada na Terra e logo descobrimos que nosso futuro já foi desenhado: Nascer, crescer, estudar, trabalhar, casar, ter filhos, ter netos – que também irão crescer, estudar, trabalhar, casar, ter filhos e ter netos.

Um desvio de rota significa uma afronta aos valores da sociedade. Não quero dizer que tais valores não têm estima, mas acredito que cada pessoa tem a capacidade de construir os próprios caminhos em busca da realização pessoal. Se quiser abrir um negócio inusitado em vez de procurar um emprego, faça isso. Se não quiser casar, não case. Se quiser casar depois dos 40, fique à vontade. Não quer ter filhos, não tenha – a decisão é inteiramente particular.

Sem dúvida, sempre haverá uma ou outra mão apontando e criticando, tentando nos reprimir. Às vezes, mesmo quem nos ama não compreende nossas decisões – e lá vêm os conflitos. É preciso buscar equilíbrio - nada como pesar a importância do que desejamos fazer e das consequências desses atos. E muita atenção com o tempo das meias.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Novo Olhar


“De modo geral acho que nos contentamos com muito pouco. Não falo em dinheiro, carro, casa, roupa, jóias, viagens, que esses cobiçamos cada vez mais. Refiro-me aos tesouros humanos: ética, lealdade, amizade, amor, sensualidade boa.” (Lya Luft, Perdas & Ganhos)

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Cobiçamos objetos de valor material, desejamos ter mais dinheiro, adquirir mais, ter mais do que os outros. Raro é ver alguém enlouquecido por generosidade, da mesma forma que mulheres perdem a razão por sapatos nas vitrines. Queremos trocar de carro para ter o modelo do ano, mas não consideramos mudar o modo de pensar e agir. Renovamos os objetos, mas os nossos valores estão cobertos por pó.

Com a chegada do fim do ano, surge a proposta de reflexão. Estamos no último mês de 2010 e dispara o alerta interno que nos faz questionar as nossas realizações no ano que passou – voando, como sempre. Às vezes é difícil ouvir o alerta com o barulho das promessas de um natal perfeito parcelado em dez vezes sem juros. Mas os que conseguem escutar essa voz interior, já exausta nesta altura do ano, começam a equação das atitudes tomadas nos últimos 12 meses. Benditos sejam.

Pensamos nos amigos para quem paramos de ligar. Na família que não visitamos tanto quanto deveríamos. No trabalho com o qual fomos displicentes em alguns momentos. Nos dias em que não fomos à academia. Nas provas para as quais não estudamos. Nas aulas em que não prestamos atenção. Nos aniversários em que não comparecemos. Nas palavras que proferimos sem pensar. E nas que deixamos de dizer.

Vivemos nessa contradição de fazer o que esperam de nós em detrimento do que queremos. Ou o contrário. Porém, considero abençoados os que têm essa consciência – e não culpa -, ao menos. Como disse Lya Luft, nos contentamos com pouco no que diz respeito aos tesouros humanos, não palpáveis. Ponto para aqueles que não desistiram da reflexão em um mundo em que bolsas de milhares de dólares são cobiçadas, enquanto onze mil crianças morrem de fome por dia.

Os especiais que passam na televisão, a decoração nas ruas, as festividades – até os lindos caminhões da coca-cola cobertos por luzinhas de natal que vemos por aí – têm um efeito terno sobre os nossos corpos cansados da correria diária. Aproveitemos, então, para refletir. E continuar a fazê-lo durante os próximos 12 meses, e assim por diante. Agradecer pelas conquistas e bênçãos, seja para o seu deus, santo, ou para o universo. Utilizar a capacidade humana de racionalizar as atitudes para dar bom uso aos sentimentos. Valorizar as conquistas materiais, mas não depositar nelas todo o contentamento. Pensar, sentir, viver. Não há melhor presente – e esse não precisa ser parcelado.